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sexta-feira, 13 de maio de 2011

O Contexto das Diferentes Aprendizagens - Texto 2

LABORATÓRIO DE APRENDIZAGEM: QUANDO APRENDER SIGNIFICA CRESCER

Valéria Carvalho de Leonço 
Pedagoga, Psicopedagoga, Mestre em Educação. 
Assessora Psicopedagogia SMED  
A escola é conteúdo e relações específicas:
é preciso encontrar  prazer em ambos para atingir a alegria. 
Snyders, 1993.

Quando tratamos do tema -laboratório de aprendizagem-, é certo que refletiremos sobre um espaço que, completamente imbricado com o projeto pedagógico da escola, recorrerá a uma visão de  caráter interdisciplinar, aos apontamentos de várias outras áreas do conhecimento para trabalhar seu objeto de estudo: a aprendizagem.

Assim, marcado por esta identidade, pela perspectiva de um trabalho entrelaçado por outras áreas do conhecimento é  que o profissional que atua junto aos laboratórios de aprendizagem deverá imprimir sua ação, tendo sempre em vista que  um mesmo problema de aprendizagem poderá  ter  como fonte inúmeros fatores determinantes. Certamente o professor que atua neste espaço utilizar-se-á  de uma prática que dará a esse fenômeno, o que versa sobre o não-aprender dos alunos, a amplitude necessária para ser investigado.
Vivemos na perspectiva de um novo tempo, de um novo milênio. O século passado  trouxe a tecnologia ao campo do ensino, dimensionando as possibilidades de acesso e aprendizagem  às classes mais excluídas de nossa sociedade. Compreendeu-se  que a comunicação de um conhecimento necessita de um sujeito do conhecimento e que, para tanto, as atividades propostas  devem supor a existência de estruturas, esquemas, linguagem, lógica, etc.
Mesmo diante de todas as potencialidades  presenciadas, este é  também um tempo que conheceu  o fracasso institucional, através da não aprendizagem escolar que, por  meios e motivos diferenciados, abarca as mais diversas classes sociais.
Segundo Macedo (apud Scoz, 1992, p. xi):

... esta situação é, obviamente, analisada e combatida em muitas frentes. (...) A criança não aprende, por não querer, não poder, ou  não saber como fazê-lo. Tem-se aí um vazio, um vácuo, em que pólos de um mesmo contínuo (o ensinar e o aprender/ o objeto e o sujeito do conhecimento) rompem-se, um procurando ou fugindo do outro. Mas, muitas vezes, não se encontram ou não são pegos.
           
Temos aqui uma interposição do autor, referindo-se às dificuldades do sujeito no seu processo de aprendizagem. Não é, de forma alguma, uma simples visão  reducionista de que basta estar na escola para não aprender e, sim, de sempre manter a questão do  por que alguém dentro da escola fracassa. Por mais incoerente que pareça a pergunta, torna-se válida na medida que esta é a realidade que se impõe a estes tempos. Existem boas escolas, há bons  professores e, mesmo diante das precariedades do ensino público brasileiro, os alunos, de uma forma geral, gostam da escola. Então, por que a lacuna? Essa é a resposta que desejamos obter quando organizamos o trabalho de intervenção  pedagógica dentro dos laboratórios de aprendizagem.
É neste espaço fértil de construções que acredito que os laboratórios de aprendizagem  possam proporcionar uma contribuição valiosa à escola como um todo.
Assim, a Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre-SMED, através de sua assessoria  psicopedagógica, apresenta uma proposta de  trabalho, comprometida  com uma visão crítica de sua práxis, que possibilite às escolas um processo de análise das questões objetivas e subjetivas que  envolvem a aprendizagem, considerando os aspectos epistemológicos, sociais, psicológicos e culturais que envolvem, em tempos contemporâneos  as crianças, os adolescentes, bem como  os adultos aprendizes.
            A assessoria psicopedagógica, em conjunto com a assessoria de psicologia,  se propôs a refletir, discutir e intervir nos aspectos que tratam da aprendizagem e  suas interfaces nos laboratórios de aprendizagem, propiciando, em conjunto com os diferentes segmentos das escolas e das assessorias da SMED,  formas de  intervenção que minimizem as dificuldades individuais e que atendam os espaços coletivos de aprendizagem.
               Portanto, recorro a algumas reflexões que em outros  momentos já manifestei ( Leonço, 2002), para voltar a falar deste tema, laboratórios - agora a partir de um recorte mais focado sobre os espaços construídos  pelas escolas da rede municipal de educação, considerando, também, os aspectos da aprendizagem dos alunos que, parcial e momentaneamente, não estão organizando seu processo de ensino  a partir da lógica pensada pela  escola.  Esta é uma tarefa com características muito complexas.
               Volto a insistir que os laboratórios de aprendizagem só podem ser pensados  se, junto, a escola também estiver sendo pensada. Nesse sentido, é importante conceber essa instituição como um lugar que busca encontrar prazer nas relações entre o aprender e o ensinar, entre as pessoas e a especificidade dos conteúdos. Assim, vale ressaltar que a escola não pode e não deve depender de um espaço, aqui chamado laboratório, como o único que certamente irá trabalhar e resolver as dificuldades apresentadas pelos alunos. Por quê? Porque compreender os problemas que envolvem a aprendizagem não significa pensar somente sobre o que é normal ou patológico no contexto do aprender e do não-aprender[1]. E preciso antes de tudo refletir  “sobre o que é pertinente ao fracasso escolar e o que é parte sintomática das dificuldades de aprendizagem. Investigar, diagnosticar, entender os meandros que cercam o sujeito e sua construção aprendente é uma tarefa complexa”.(Leonço, 1998, p.335).
               A escola, para cultivar e preservar  a presença de um espaço de aprendizagem como deve ser entendido o laboratório, precisa perguntar-se entre outras coisas, sobre:

  • Como compreende o aprender e o  ensinar e qual é, efetivamente,  seu projeto pedagógico?
  • Como entende o aluno que não-aprende?
  • Quais são os critérios para eleger os profissionais adequados para trabalhar neste espaço?
  • Como acompanha o trabalho realizado?
  • De que maneira organiza espaços para as trocas entre os professores de sala de aula e os professores dos laboratórios?
  • Quais os fatores que interferem no sucesso do processo de ensino e aprendizagem?

               A orientação perpassada nos encontros com os professores dos laboratórios de aprendizagem que, junto com as assessoras estão construindo este espaço de pensar e fazer,  é poder imaginar a intervenção pedagógica dos laboratórios num contexto  que determine a construção saudável da aprendizagem e não caracterize a patologia da dificuldade no aprender, mas, sim, crie alternativas de resgate do desejo desse sujeito, oportunizando compreendê-lo dentro do processo, não o estigmatizando ou afastando-o.
               Dessa forma, percebo os  laboratórios como  espaços de ressignificações que detém um ritmo e um tempo diferenciado da sala de aula. Não se pode pensar em exercer sobre seus responsáveis a idéia de curar, adequar alunos ao processo ou ao ciclo. O trabalho no laboratório não reforça aprendizagens, não treina conceitos, não faz cópias. É, sim, um fazer onde o educador responsável busca conhecer as interferências na aprendizagem. Certamente esta atividade só será possível, se todas as forças da escola colaborarem. Portanto, a parceria com o serviço pedagógico na instituição é essencial. Parceiros nesta  assessoria, tanto orientador educacional, como o supervisor escolar serão aqueles que levarão para a sala de aula as interferências obtidas nas pesquisas e as metodologias construídas a partir do trabalho desenvolvido no laboratório de aprendizagem.
               Assim, será o laboratório, necessariamente, um espaço de investigação e inovação que deverá  tornar-se uma extensão da sala de aula tendo como meta, atender tanto ao aluno, como fornecer subsídios às estratégias didáticas do professor.     É aqui que iremos pensar nos alunos que apresentam lacunas, defasagens, comprometimentos no campo da aprendizagem, apostando, antes de qualquer coisa, nas suas possibilidades de superação.

               Considerar então que as descobertas trabalhadas no laboratório de aprendizagem são extensivas à sala de aula, é destacar alguns pontos importantes envolvidos nesse processo de investigação/intervenção que necessitam ser considerados quando se oportuniza uma reflexão sobre o tema.
               Dessa forma, o trabalho no laboratório de aprendizagem vai exigir do profissional que nele atua, conhecimentos e posturas específicas no que se refere ao diagnóstico e a intervenção e uma atuação competente na expectativa de resgatar o vínculo com o conhecimento, com a escola, com o professor da sala de aula; intervindo nas ansiedades, medos, frustrações e conflitos frente aos novos desafios que certamente ele, aluno, deverá ser envolvido. Sem um conhecimento profundo do aluno, dos fatores que naquele momento bloqueiam suas estruturas operatórias e o distanciam da aprendizagem, não será possível realizar um trabalho de resgate efetivo.
               Trabalhar no espaço do laboratório de aprendizagem é necessariamente pensar em alguns tópicos essenciais, como  vínculo, modalidade de aprendizagem, expressão corporal, vivências expressivas, desejo e o  brincar.
               É o olhar diferenciado, a intervenção específica do professor que vai dar a esses recursos  a dimensão pretendida com relação ao sujeito da aprendizagem. O que ressalta o trabalho do educador nesse espaço é a possibilidade de assinalar ao sujeito suas próprias conquistas. Conquistas estas que nem sempre estarão ligadas ao conteúdo formalizado.  Não se apregoa no trabalho realizado no laboratório adequar  ou alinhar  o sujeito da aprendizagem a algum pré-requisito de aprendizagem, mas, sim, oportunizar espaços  para  que o aluno possa ressignificar seu processo de aprendizagem.
               Trabalhar em um espaço que  precisa rever constantemente os fracassos, as frustrações, as angústias, ocorridas no processo de aprendizagem e, que, de alguma forma determinaram a chegada do aluno até o laboratório de aprendizagem, requer que o profissional disponibilize uma grande capacidade afetiva, espírito de persistência e alta taxa de tolerância à frustração, buscando sistematicamente capacitar-se.
               Reconheço a complexidade do tema e a responsabilidade da tarefa. Mas, acima de tudo, considero a intervenção oportunizada neste espaço diferenciado de aprendizagem como aquela que talvez detenha, em última instância, a possibilidade de resgatar de forma digna o sujeito do conhecimento que, por incontáveis ou desconhecidos motivos, pode estar oprimido em nossos alunos.
               Tenho certeza que os artigos oportunizados pelos colegas nesta publicação são um claro indicativo que esta preocupação ocupa um espaço significativo no trabalho desenvolvido pelos professores dos laboratórios de aprendizagem.

REFERÊNCIAS
LEONÇO, Valéria Carvalho de. In: Revista Ciências e Letras. Porto Alegre: FAPA, n. 23/24, 1998.
LEONÇO, Valéria Carvalho de. In: Revista Ciências e Letras. Porto Alegre: FAPA, n. 32, 2002.
MACEDO, Lino de. Prefácio. In: SCOZ, B. et al. Psicopedagogia: contextualização, formação e atualização profissional. Porto Alegre: Artes Médicas, 1991. 161p.
PAIN, Sara. Diagnóstico e Tratamento dos Problemas de Aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986.
SNYDERS, George. Alunos Felizes. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993.



[1] Neste texto utilizo o termo não-aprender ou mesmo não-aprendizagem, grafado com hífen, para caracterizá-lo como um processo temporário e não permanente no sujeito que, momentaneamente, não aprende.

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